quarta-feira, 9 de agosto de 2017

O QUE É UM VERDADEIRO EXPERT

                Hoje se usa com muita prodigalidade o vocábulo expert. Não há um marchand-de-tableaux ou crítico de arte recém improvisado que não o seja. Mas que é, afinal, um expert? 
                Meu saudoso amigo Jorge Beltrão (primeiro grande marchand brasileiro), com quem aprendi muita coisa sobre arte, uma vez de disse: "Um homem que em toda a sua vida viu apenas um Di Cavalcanti não pode saber se é bom ou mau; se viu dois, um terá sido melhor que o outro; quando tiver visto e estudfado uma centena de obras do mesmo artrista, sua opinião terá alguma probabilidade de ser realmente válida; e quando tiver visto mi, está em via de se tornar um expert naquele determinado artista. 
                Um expert é, pois, alguém que, pelo estudo profundo e paciente, tendo adquirido conhecimento particular a cerca de um determinado artista ou escola, pode, com autoridade, emitir opiniões e juízos sobre a autenticidade de uma determinada obra pertencente àquele artista, àquele período ou àquela escola.  
                A ação do expert restringir-se-á forçosamente ao campo do conhecimento de sua especialidade; uma opinião de Bernard Berenson sobre uma pintura italiana do Renascimento terá, logicamente, muito maior força que outra opinião do mesmo expert a cerca de, por exemplo, um quadro holandês da mesma época. 
                Evidentemente, mesmo o melhor experte pode equivocar-se (e frequentemente o fazem), ou discordarem entre si. No primeiro caso é prova o logro de que foi vítima o célebre expert holandês Abraham Bredius, atestando a autenticidade de um Vermeer de Del pintado pelo falsário Van Meegeren, autor da obra tão perfeita que o próprio falsário teve de provar, em juízo, que sua pintura era falsa para não ser condenado à morte - está história está contada integralmente neste livro) - ; no segundo caso, as opiniões controvertidas de toda uma legião de famosos críticos e historiadores de arte acerca do quadro "Sagrada Família", pertensente à Coleção Kress da National Gallery de Washington.  Veja as opiniões dos experts: 
              Berenson disse - "autoria entre Catena e o jovem Ticiano" ( e mais tarde, em sua obra Italian Pictures of the Renaissance, algo inopinadamente: "Giorgiane");
              L. Venturi disse: - "É um Catena"; 
              T. Borenius disse: - "Mestre da Natividade Allendale"; 
               R. Loghui disse - "É um Giorgione"; 
               G.M. Richter disse: -"É um Giorgione, mas a paisagem foi pintada por Sebastiano Del Piombo"; 
                H. Tietza disse: - "É de um aluno desconhecido de Giovanni Bellini"; 
                A. Venturi disse: "É de um intérprete de Giorgione, mas não do próprio Giorgione". 
                Todos  acima mencionados, famosos experts, são unanimes em considerar a obra em apreço como pintura de alta qualidade, mas em termos já não mais de crítica de arte e sim de mercado de arte; existe uma enorme diferença entre o preço de um Giorgione e o de um Catena.  
                Como se pode perceber, um verdadeiro expert é pessoa rara. Num mundo em que as comercializações se tornaram mais importantes que a qualidade, torna-se difícil para um marchand dedicar o tempo necessário para realmente analisar, com profundidade, uma obra antes de dar seu expertise. 
                Estima-se que atualmente, metade das obras de arte negociadas no mundo são falsas. Numerosos Van Gogh, 70% dos "Chagal" e 90% do "Dali". Também Picasso, Rembrandt, Renoir, Gustav Klint, Macke são os preferidos dos falsários de nossos dias.
O pintor falsário alemão Edgar Mrugalla calcula que já copiou cerca de 3.500 quadros de artistas famosos ao longo de sua vida. Esta enorme produção de obras falsas cria grandes dificuldades para os experts. 
                No nosso caso brasileiro o problema das expertises não é tão controvertido, pois são artistas recentes e muitos ainda estão vivos. Mesmo para os mortos há ainda, entre os marchands, críticos e amadores de arte, uma lembrança muito nítida das obras mais importantes como, por exemplo, dos criadores do modernismo brasileiro.  Apesar disso, nota-se, cada vez mais pronunciado, o aparecimento de obras de importantes artistas no mercado de falsos e possíveis falsos. 
                Os princípios que regem a expertise são os seguintes: 
                a / O expert não deve manifestar-se sobre a qualidade da obra e sim limitar-se ao problema de sua autenticidade; 
                b/  Quem vende uma obra de arte não pode ser ao mesmo tempo autor de sua expertise; 
                 c/ O expert pode ser responsabilizado juridicamente, sempre que ficar patenteada a má fé de qualquer expertise, mas não será culpado quando, de plena consciência, tiver expedido uma opinião depois contestada; 
                 d/ O valor de uma expertise acha-se na razão direta do conceito de que goza quem a assina; 
                  e/ Nenhum expert, digno de nome, fará jamais, considerações de ordem financeira ou se referirá aos preços do mercado de arte. 

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